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segunda-feira, 20 de julho de 2009

Tarde dançante





O título parece estranho. Evidentemente a tarde não dança. As pessoas dançam. Ocorre que “ tarde dançante” é um evento para a chamada 3ª idade ( confesso não saber o que será a 4ª idade, a 5ª e por aí vai). Realiza-se no Tijuca Tênis Clube, um clube tradicional no bairro do mesmo nome no Rio de janeiro. A pequena burguesia tijucana é conhecida exatamente por representar, aqui no RJ, a sigla TFP .
Confesso ter um certo preconceito com esses eventos. Dançar é bom em qualquer idade, a boa música também. Bom, vencido o (pré)conceito contra a denominação 3ª idade, abri coração e mente e lá fui acompanhada de duas amigas.
Música ao vivo. Músicos da melhor qualidade. Bota qualidade nisso. Não havia cantores profissionais. Para minha surpresa, os cantores eram os participantes da “tarde”. Senhores e senhoras que, despidos de preconceitos, na sua singeleza e alegria, cantavam, alguns bem, outros mal, músicas das décadas de 50 e 60. Os músicos acompanhavam bem a todos, os bons e os maus.
Não sendo dada a saudosismos, surpreendi-me ao relembrar os discos de 78 rotações ouvidos na vitrola da minha infância. Recordei alguns versos das letras daquelas músicas: “ bar refúgio barato dos fracassados do amor”; “caminhemos, talvez nos vejamos depois”; “ ave maria... rogai por nós os pecadores”; “ninguém é de ninguém” etc. Agora, penso como são tristes essas letras. O amor era irrealizável. A traição uma constante. A dor de cotovelo mais constante ainda. Esses temas são cantados, de outra forma, até hoje. Prefiro o hoje.
A tristeza das letras musicais não empanou, nem empana a alegria dos participantes. O importante é o encontro. É o traje adequado, as calças masculinas vincadas, o salto alto, os vestidos rodados,o perfume, mas, sobretudo, o mais importante é a dança.
Casais rodopiavam no melhor estilo Carlinhos de Jesus. Passos cruzados pra cá e pra lá. Todos graduados em academias de dança do salão. Pode-se tocar samba, mambo, tango, pagode, rock, sinfonias de Bethoven, baião, marcha nupcial, parabéns pra você, seja lá qual for variedade musical, os rodopios são os mesmos.
Ao lado da dança e do encontro, hoje, no tempo do ficar, havia a paquera. Cavalheiros passeiam pelo local, lançando olhares discretos na escolha de suas damas. Olhares enviesados são trocados. Um clima fantástico dos anos cinquenta.
Quebrado o preconceito, adorei. Ri com a arte da paquera dos meus 18 anos, ri da minha falta de habilidade para a dança de salão ( preciso me graduar nisso. Meus pés, com tanta troca, quase dão um nó!). Um senhor me disse que sou capaz de aprender rápido. Umas dez aulas. Fiquei aliviada! No meu caso, com certeza, deveriam ser umas cinquentas aulas. Constato que com tanto vai para a direita, vai para a esquerda, sou uma descordenada motora.
Ri com as “paqueras” das minhas amigas. Uma delas conversava com um senhor bonito. Estavam encostados na grade da varanda. Falavam dos bairros Copacabana e Tijuca. De repente, ele perguntou :

-você não quer ir para o andar de cima?

Espantada, ela retucou:

- qual andar? O terceiro?

O além, respondeu ele.

O moço estava deprimido com morte da esposa , queria morrer para encontrar-se com ela. Não deixa de ser romântico. Todavia, estava ali com sua calça de linho branco, com vincos marcados, camisa azul, sapatos brancos para combinar com a calça. Mesmo dolorido com a perda da esposa, estava "paquerando". Palmas para ele. Tentava, pelo menos, aliviar a solidão e dizer-se estou vivo.
A outra, que havia feito megahair, dançava garbosa e galhardamente. Volta de meia, abaixava-se para pegar um fio de cabelo que, eventualmente, descolava. Os cavalheiros não devem ter entendido nada. Afinal, o cabelo era dela , já estava pago e ela tinha de recuperá-lo.
A tarde que dançava acabou sendo divertida e uma lição de descontração e bom humor.

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