Total de visualizações de página

quarta-feira, 30 de setembro de 2009







O mar, o tempo e leituras


Algumas vezes ao lermos textos diversos nos deparamos com algumas expressões que nos remetem à reminiscências. Não uma saudosista por natureza. Não sei se isso é positivo ou não. Penso que é melhor viver o agora, porém, no agora somos o resultado da poeira do nosso tempo. Foi esta expressão, lida num texto qualquer, que me fez reminesciar. A partir daí, lembrei-me de algumas expressões que marcaram o meu agora.
A primeira delas, foi quando num período conturbado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro/FFP-SG, não lembro datas, numa daquelas assembléias típicas das greves, um aluno, que era da Marinha, pediu a palavra e ao microfone disse em alto e bom som: " a nau está sem timoneiro". Sem considerarmos a situação quando isso foi dito, o que li me recordou esse aluno, já um senhor de cabeça e bigode brancos, e essa constatação. De fato, em nossa nau-nave-vida , não sabemos quem é o timoneiro. Por vezes, pensamos que somos nós mesmos, mas com Camões repito: " ledo engano d'alma".
A segunda, foi a crônica Nós, águas e pedras, de Wanderley Soares. Nesta crônica o autor refere-se ao universo feminino e masculino. Se os homens não entendem o universo feminino, as mulheres, apesar de mães de homens, também não endentem o universo masculino. Eu, particularmente, não entendo nem o feminino, nem o masculino. Mas recordei-me de uma expressão daquela crônica: " ... marinheiros, viajores de todos os mares..." E nesta viagem, vamos vivendo este bipolar desentendimento. Amando, desamando, chorando e rindo.


A terceira e última, lembrei-me de uns versos dos poetas e músicos Hermínio Belo de Carvalho e Paulinho da Viola que assim dizem:" não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar".



quarta-feira, 23 de setembro de 2009



A expressão mais usada no jornalismo é “eu acho”. Em achando, emitem idéias prosaicas, bizarras e tolas. No caso, do Zelaya ouvi pérolas de quem nunca trabalhou, de fato, em uma embaixada. Todos falam em nome do Brasil. O Brasil não deveria isso, não deveria aquilo. Até uma professora de direito internacional da USP foi chamada para opinar. Evidenciou-se, mais uma vez, a eterna questão teoria vs prática. Ministrar aulas sobre direito internacional é fato teórico, ter um presidente que foi eleito e depois deposto pelo Congresso e pelos militares batendo à porta de Embaixada Brasileira é fato real.


E palram... e palram... neste palavrório jornalístico, fica muito clara a negatividade. Nunca há a predominância de notícias e comentários dos aspectos positivos dos fatos. Só o negativo é evidenciado. Muito“não” pra pouco “sim”. Se prestarmos muita atenção aos noticiários, chegaremos à seguinte conclusão: viver neste planeta é uma droga.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Deus e o Diabo











Gosto de alguns autores portugueses. Miguel Torga, Augusto Abelaira, António Lobo Antunes e por aí vai. Em especial, gosto muito deste poema do José Régio. O que diz esse poema tem muito de mim e de todos que, constantemente, se questionam. Interpretado por Paulo Gracindo, é inesquecível.







Cântico Negro







"Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
— Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?




Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.




Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...




Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tetos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.




Ah, que ninguém me dê piedosas intenções,
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se alevantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!




domingo, 6 de setembro de 2009



Pior que a convicção do não, a incerteza do talvez é a tristeza do quase. O jogador que quase ganhou, continua jogando, o estudante que quase passou, continua estudando. O que quase aconteceu, em verdade, não aconteceu nem acontece. Viver pensando no quase é viver no outono. As oportunidades escapam por pensar demais, as chances se perdem pelo medo, as idéias não saem do papel. Mas, existem alguns que dizem/escrevem conteúdos-idéias que nos causam muito prazer e nos obrigam à busca daquilo que julgamos certo. Outros escutam, lêem, compreendem e passam para do pensamento para a realiz(ação). As idéias saem do papel, saem do quase e ganham vida.


Dentre os que pensam e escrevem, destaco, no século XIX, o cubano José Julián Martí y Pérez. Poeta, ensaísta, professor, filósofo e teórico político. Nasceu em 28 de janeiro de 1853, morreu em 19 de maio de 1895.


Durante sua curta vida, Martí saiu de seu ideário político e partiu para a ação. Foi um revolucionário, um lutador pela independência de Cuba da Espanha. Não viveu para ver Cuba liberta dos espanhóis. Em 19 de maio de 1895, Martí foi preso e mutilado pelo exército espanhol e seu corpo foi exibido à população em diferentes partes da Ilha.


Martí defendia a guerra sem ódio. Para ele, a luta só é válida se promover uma profunda transformação no comportamento humano nos aspectos culturai,s políticos, econômicos e sociais. Dizia ele:” quem se sentir ofendido com a ofensa feita a outros homens, quem não sentir na face a queimadura da bofetada dada noutra face, seja qual for a sua cor, não é digno de ser homem”.[1]


Saindo da teoria para a ação, Martí deixou o quase. Tornou-se um símbolo da luta pela independência buscando igualdade social. Em Cuba, inspirou estudantes, entre eles, Fidel Castro.


A revolução cubana, liderada por Fidel, trouxe mudanças profundas, propostas por Martí, no comportamento do povo cubano: autoestima elevada, respeito pela cultura, taxa de analfabetismo próxima a zero, baixo índice de mortalidade infantil, menor número de casos de AIDS per capita no mundo, entre outros. Não se pode negar, também, que o menor número de aparelhos celulares e acesso à Internet, no mundo, estão, também, em Cuba. Mas isso é outra história.








[1] MARTÍ,José. Páginas Escolhidas. Rio de Janeiro. Alba,1940