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sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Li, gostei e transcrevo texto de José Neves


O prof. Andrew Oitke publicou o seu polémico livro "Mental Obesity", que revolucionou os campos da educação, jornalismo e relações sociais em geral. Nessa obra, o catedrático de Antropologia em Harvard introduziu o conceito em epígrafe para descrever o que considerava o pior problema da sociedade moderna: "Há apenas algumas décadas, a Humanidade tomou consciência dos perigos do excesso de gordura física por uma alimentação desregrada.  Está na altura de se notar que os nossos abusos no campo da informação e conhecimento estão a criar problemas tão ou mais sérios que esses."  Segundo o autor: "a nossa sociedade está mais atafulhada de preconceitos que de proteínas, mais intoxicada de lugares-comuns que de hidratos de carbono." 

As pessoas viciaram-se em estereótipos, juízos apressados, pensamentos tacanhos, condenações precipitadas. Todos têm opinião sobre tudo, mas não conhecem nada. Os cozinheiros desta magna "fast food" intelectual são os jornalistas e comentadores, os editores da informação e filósofos, os romancistas e realizadores de cinema. Os telejornais e telenovelas são os hamburgers do espírito, as revistas e romances são os donuts da imaginação. 

O problema central está na família e na escola "Qualquer pai responsável sabe que os seus filhos ficarão doentes se comerem apenas doces e chocolate. Não se entende, então, como é que tantos educadores aceitam que a dieta mental das crianças seja composta por desenhos animados, videojogos e telenovelas. Com uma "alimentação intelectual" tão carregada de adrenalina, romance, violência e emoção, é normal que esses jovens nunca consigam depois uma vida saudável e equilibrada."

Um dos capítulos mais polêmicos e contundentes da obra, intitulado "Os Abutres", afirma: 
"O jornalista alimenta-se hoje quase exclusivamente de cadáveres de reputações, de detritos de escândalos, de restos mortais das realizações humanas. A imprensa deixou há muito de informar, para apenas seduzir, agredir e manipular." O texto descreve como os repórteres se desinteressam da realidade fervilhante, para se centrarem apenas no lado polêmico e chocante. "Só a parte morta e apodrecida da realidade é que chega aos jornais." Outros casos referidos criaram uma celeuma que perdura. "O conhecimento das pessoas aumentou, mas é feito de banalidades." Todos sabem que Kennedy foi assassinado, mas não sabem quem foi Kennedy. 
Todos dizem que a Capela Sistina tem tecto, mas ninguém suspeita para que é que ela serve.
Todos acham que Saddam é mau e Mandella é bom, mas nem desconfiam porquê.
Todos conhecem que Pitágoras tem um teorema, mas ignoram o que é um cateto».

As conclusões do tratado, já clássico, são arrasadoras. "Não admira que, no meio da prosperidade e abundância, as grandes realizações do espírito humano estejam em decadência. A família é contestada, a tradição esquecida, a religião abandonada, a cultura banalizou-se, o folclore entrou em queda, a arte é fútil, paradoxal ou doentia. Floresce a pornografia, o cabotinismo, a imitação, a sensaboria, o egoísmo. Não se trata de uma decadência, uma «idade das trevas» ou o fim da civilização, como tantos apregoam. É só uma questão de obesidade. O homem moderno está adiposo no raciocínio, gostos e sentimentos. O mundo não precisa de reformas, desenvolvimento, progressos. Precisa sobretudo de dieta mental."

sábado, 24 de julho de 2010

Por que escrever?


Clarice Lispector, no romance Água Viva, nos esclarece:" escrever é a palavra pescando o que não é palavra". Escrever é a possibilidade de quem tem na palavra uma forma de evasão e de (com)partilhar.

Escreve-se para si próprio  e, simultaneamente, para o outro. A palavra pesca o dito e quando acontece o entreleçamento entre o dito e o não-dito mergulha-se numa comunhão universal entre  escritor e leitor porque fazemos parte do mesmo presente temporal e do mesmo futuro intemporal.

Nós, escritores e leitores, somos seres humanos que partilhamos  as dores e as alegrias que o viver e o existir nos impõem.  Somos companheiros de uma realidade quotidiana. Mais tarde seremos o pó da História, o pretérito que se cumpriu para o bem e para o mal.

Essa comunhão universal se traduz numa solidariedade umbilical e cósmica porque " escrever a palavra que pesca o que não é palavra" deixa claro que onde está ou tenha estado o Homem é preciso que esteja ou tenha estado toda a humanidade. Afinal, ninguém é feliz sozinho, nem mesmo na eternidade.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

EPÍSTOLAS - ELIZA E MÉRCIA


O gênero epistolar, se assim podemos chamar, é forma de expressão escrita que - mesmo no tempo do e-mail- merece atenção. Escrever cartas é um exercício da linguagem e do pensamento. Algumas cartas são exemplos de literatura que nos conduzem à reflexão.

Em 1900, no Rio de Janeiro, foi lançada a Revista da Semana. Esta revista circulou por mais de 30 anos. Em 1914, foi inaugurada uma seção que tinha por título "Cartas de Mulher". Esta seção era assinada por Iracema, um pseudônimo que, segundo a revista, "ocultava uma das mais cultas e espirituosas senhoras da elite da sociedade carioca".

De 1914 a 1919, a publicação semanal foi constante. Tratava-se de artigos, sob a forma espistolar, sobre a assuntos femininos.

Destaco aqui um fragmento de uma carta datada de 30 de dezembro de 1916. Nesta carta Iracema fala-nos da concepção de amor para os dois sexos. Escreve ela:

"A concepção do amor é diversa nos dos sexos. O homem exige no amor compensações e satisfações. Para o homem, a mulher é  o objeto, é a cousa amorosa que ele tem o poder de destruir. Para a mulher o homem é a divindade por quem ela se imola. Perante a traição, o homem enfurece-se e a mulher sucumbe".

Neste fragmento, observa-se um problema moral de duplo valor. O homem traído tudo pode, ele tem o poder de destruir. Espanta-nos a atualidade do conteúdo. Na época - 1916- e até hoje, o homem pode se enfurecer. É só ver e ouvir os casos de Eliza e Mércia ocorridos em 2010, ambas morreram por serem consideradas "cousas amorosas" e de alguma forma incomodaram o ego do goleiro Bruno e do advogado Bispo.



quinta-feira, 27 de maio de 2010


Quem representa perigo para a paz mundial?
Quem representa perigo para a paz mundial? O Irã, que talvez pudesse vir a construir armamento nuclear, mas que não ocupa nenhum outro país? Ou os EUA, único país na história que usou a bomba atômica e que possui um arsenal que representa a metade de todo o armamento existente no mundo? - 20/05/2010 ( BLOG do Emir, in Carta Maior)



sexta-feira, 9 de abril de 2010

Há dias


Há dias nublados


“ .... tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu...”

Acho que é do Chico Buarque.

Há dias...acordamos e perguntamos: Por quê? Para quê? Dias nublados. Estes são os dias da nostalgia. Vontade de chorar com ou sem os porquês. É o chorar para qualquer coisa. Chorar a alma para a dor esvair-se. Não sabemos qual dor. É ela, somente a dor. A dor vazia do vazio.
Não é a dor do amor de Camões, aquela “que nasce não sei onde e dói não sei porque”. A dor de amor é generosa.
Nestes dias doloridos, é deixar a angústia fluir, instalar a dor cruel do tédio. E depois voltar à renovação com a alma já esvaziada. Indolor.
Num destes dias li, na Obra Poética de Fernando Pessoa, este texto que é a tradução deste estado humano d’ alma.



Aconteceu-me do alto do infinito
Esta vida. Através de nevoeiros,
Do meu próprio ermo ser fumos primeiros,
Vim ganhando, e através estranhos ritos

De sombra e luz ocasional, e gritos
Vagos ao longe, e assomos passageiros
De saudade incógnita, luzeiros
De divino, este ser fosco e proscrito...

Caiu chuva em passados que fui eu.
Houve planícies de céu baixo e neve
Nalguma cousa de alma do que é meu.

Narrei-me à sombra e não me achei sentido.
Hoje sei-me o deserto onde Deus teve
Outrora a sua capital de olvido.
..

( PESSOA, Fernando. Obra Poética/ Cancioneiro. Aguilar. RJ, pág.127)

quinta-feira, 25 de março de 2010

Saúde e lixo





O papel higiênico é biodegradável. Por que encontramos, nos banheiros, de escolas e hospitais o aviso: “não jogue papel no vaso”?
Fico cá a matutar, com tanta informação acerca das bactérias ( existe até, em um programa de TV, o dr bactéria) por que será o papel biodegradável não pode ir goela abaixo do esgoto? Existe tarefa mais bacteriana do que colocar as mãos, mesmo com luvas, neste lixo?
A rede de água e esgoto foi criada por engenheiros para esta, dentre outras, finalidade. Para o esgoto existe um tratamento da água. Pagamos taxas por este serviço.
Somos, atualmente, conscientizados e ensinados para a reciclagem do lixo. Aprendemos o que é descartável e o que não é. Para o lixo reciclável, separamos e lavamos as garrafas pet, os potes de margarina etc. Tudo lavado e limpo. O papel higiênico biodegradável é pego com a mão por algum ser humano, apesar de se dissolver na água. Para isto existe a descarga em todos os banheiros.
A explicação é que o papel entope o vaso. Como assim?!?!? E a rede de esgoto foi criada para quê? E a descarga? E o biodegradável?
Continuo a matutar: será por falta de uma educação voltada para a saúde sanitária? Ou será por uma consolidação cultural do sistema de fossas já extinto nos grandes centros urbanos?
O sistema de fossa não justifica o fato, uma vez que o papel dissolve. A falta da educação para a saúde sanitária é o mais provável. Limitar a higiene ao banho diário, à limpeza bucal, à limpeza da casa, à troca de travesseiros de seis em seis meses ( esta é a última de um dr bactéria qualquer) etc, é louvável, mas é pouco. Concluo para mim mesma: é falta da educação sanitária. Tornou-se um traço medieval de nossa cultura.
Que no seu lar e na sua casa, você opte por isso é um problema pessoal, mas ser ensinado e adotado por escolas e hospitais é problema nosso

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O saber

 Chamamos médicos, advogados, engenheiros, dentistas de doutores. Em verdade, são bachareis. Especializam-se em alguma área destas atividades.A partir do bacharelado, alguns tornam-se mestres e depois seguem para o doutorado. Há na vida acadêmica uma ordem: graduação - bacharel; pós-graduação latu-senso - especialista;pós-graduação strictu-senso - mestre e doutor.

Não é só na medicina, na advocacia, na odontologia e na engenharia que o título de doutor é pertinente. A rigor, o bacharel, o especialista, o mestre não são, a rigor, doutores. Mas, o uso do cachimbo faz a boca torta.O uso popular consagra. O consagrado pelo povo é inconteste. É sagrado.

Ter  os títulos de mestre e de doutor é uma necessidade do mercado. Não é uma busca espontânea, uma necessidade de conhecer a si mesmo para uma melhor compreensão existencial.

Conheço vários doutores. Aqueles que cursaram o doutorado. A maioria obteve o título em universidade pública. Academicamente, são doutores competentes na área do saber na qual se doutoraram.

Admiro-os. Respeito a tenacidade que tiveram para obter o título. Só quem passou por isso sabe o que é um orientador de dissertação do mestrado e/ou da tese do doutorado. Trata-se de um período de pesquisa, leituras e (re)leituras, escritos e (re)escritos, um ir e vir sem fim. Uma dor e uma angústia densas. Há muito choro e pouco riso. Terminado  este período, há a defesa da dissertação e/ou da tese. Uma banca é formada e começa o questionamento do trabalho apresentado. Um achismo sem fim. Finalmente, o título.

Fica um questionamento: para quê?

Com raras excessões, sem generalizar é claro, os egos inflam-se. O saber, titulado ou não,  é instrumento para a melhoria da qualidade da vida interior.Tornar-se um ser humano melhor, capaz de interagir com o semelhante é o princípio que norteia a ciência da educação em qualquer área do conhecimento .

O saber titulado, inflador do ego, agente da vaidade é inócuo, inválido, beira a idiotia. Principalmente, quando é patrocinado pelo ensino público, pago com nossos impostos.

É dever nosso, contribuintes, prestar mais atenção na formação destes mestres e doutores.

Qualquer ego inflado merece o desprezo. Merece ser defenestrado.


terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Carnaval

Não sendo uma carnavalesca, aproveito o período para um balanço existencial. Resolvi fazer esse balanço em Miguel Pereira. Morei algum tempo nesta cidade. Sabemos que nossa existência é um somatório do passado aliado ao presente. Só presente existe e ele é modificado a cada (re)visão. Por ser uma pessoa vivente do presente, não sei se vale à pena fazer viagens ao passado(?).
Talvez o excesso de alegria do carnaval me assuste um pouco. Os excessos me assustam.
Ser alegre é um constante estado da alma. Há almas que são sempre tristes. Parecem que tomam chá de melancolia. Essas almas melancólicas, no carnaval se travestem de uma alegria temporária. Mas, o tédio está lá. As almas tomam medicação para que possam se travestir seja cerveja , seja uísque, seja caipirinha. E a melancolia renasce na 4ª feira de cinzas.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Leituras, reminiscências e vozes do passado


Fui fazer um visita ao blog tanto mar da poeta Líria Porto. Lá, li o poema Pedregulho. Um belo texto. Uma coisa leva à outra e lembrei-me de uma crônica de uma amigo nosso, meu e da Líria, Wanderley Soares. Soares é jornalista do jornal O Sul, em Porto Alegre. Mas, houve um tempo, quando não estava assolado pelo trabalho de escrever sobre segurança pública, escrevia poemas, contos, crônicas. Transcrevo o texto que o Pedregulho da Líria me fez ouvir as vozes do passado.

Nós: águas e pedras
por Wanderley Soares

Nós, águas e pedras

Das águas mansas de lagos e rios, são longas, quase silentes e ocultas, as venturas. Não revelam, sem castigo, aos aprendizes de navegadores, suas delícias, seus baixios, suas neuroses, seus abismos devassos. Quando em vestes de megeras, têm o toque das fadas. Ao se materializarem em Vênus, contêm o veneno das tarântulas. Seus códigos não são definitivos. Como no cosmo, nada nelas se eterniza. São insondáveis as águas mansas e, por isso, assola-me o temor da mansidão dos teus olhos.
Das águas frementes dos oceanos, não são velados seus perigos, suas correntes, seus instintos invasores. Não são ocultas as baías, as áreas de calmarias, as ressacas, os romances obscenos com os rochedos. Mas marinheiros, viajores de todos os mares, sabem que nada é definitivo nos códigos dessas águas que parecem tão francas, tão reveladoras. Elas têm os mesmos cúmplices das águas mansas. São os ventos que se vão e tornam em horas não marcadas, ora sóbrios, ora borrachos; são as nuvens, ora a adornar os céus, ora a ocultar o sol e as estrelas; são as tempestades errantes. São insondáveis as águas ruidosas e, por isso, assola-me o temor das imensas vagas da tua paixão.
As pedras que vemos por aí a rolar, têm vida longa. Elas testemunham, passivas, seus próprios destinos e os destinos daqueles que ora as fustigam, como os ventos assustadores, ou daqueles que ora a acariciam, como a brisa enigmática vinda dos lagos e rios ocultos entre os vales. E rolam a pedras, sem dor, numa viagem cósmica de cometa sem órbita.
Nunca sei quando estás por chegar a mim como uma tempestade, como um tornado. Nunca sei quando estás por chegar a mim como um lago ou como um rio brando. Assola-me, por isso, o temor de, como uma pedra, me perder de ti e não morrer.
As montanhas, anciãs e sábias, gozam e sofrem, a um tempo só, todos os tempos em todas as eras. Em seus alcantis, do sopé à coroa, castelos foram construídos, reis reinaram sobre todos os restos, pois aos restos sobra a planície em que se aninham os párias. E todos os que nas montanhas reinaram, olvidaram que eram as montanhas, apenas as montanhas, que reinavam para todos os tempos, em todas a eras. E se quedaram e se quedam os que ilusoriamente reinaram e reinam.
Trazes tu, de outros tempos, o estigma das montanhas. Assola-me o temor, por isso, de me quedar de ti, da coroa ao sopé, e na planície restar.

Para pensar


DEBATE ABERTO

O ódio da mídia e a primeira vitória de Lula

O rancor da mídia corporativa tem que ser contemplado como pano de fundo de uma grande derrota. Suas ameaças só não são trágicas porque, ao arreganhar os dentes, a grande imprensa introduz notas burlescas no discurso que se pretendia ameaçador.

Gilson Caroni Filho

Se a deontologia do jornalismo não contempla a divulgação de matérias partidarizadas como se fossem notícias apuradas em nome do leitor/telespectador, o telejornalismo brasileiro, principalmente o da Rede Globo, anda precisando redefinir qual é a natureza do seu verdadeiro ofício. Que fato objetivo deflagra tanta empulhação em horário nobre? Que registro simbólico almeja sua busca de sentidos? Qual a necessidade de construção permanente de imagens desfavoráveis ao governo e, em especial, ao presidente da República? Enganam-se os que pensam que as respostas a essas questões residem apenas nas próximas eleições. Lula, por seu significado histórico, representa uma fratura bem mais profunda do que pode parecer à primeira vista.

Ao obter mais de 30 milhões de votos em 1989, o ex-líder sindical apareceu como condensação das forças sociais que se voltavam para a demolição tardia do antigo regime. Contrariando prognósticos de conceituados analistas, sua candidatura teve gás suficiente para enfrentar as máquinas partidárias de velhos caciques. Mesmo derrotado por Collor, que representava a reprodução do passado no presente, o desempenho de Lula prenunciou, de forma categórica, o fim de uma “democracia” que só era possível mediante pacto de compromisso entre as velhas elites políticas, civis e militares. Essa foi sua primeira vitória. E a Globo disso se deu conta.

O embrião de um novo espaço histórico, capaz de conferir peso e voz aos de baixo na sociedade civil, na cultura e no arcabouço estatal, estava lançado. Com uma indiscutível capacidade de antecipação histórica, a família Marinho, que construiu seu colosso midiático como um Estado dentro do Estado- e muitas vezes acima dele- pressentiu o ocaso dos dias gloriosos. Como principal aparelho de legitimação da ditadura militar, as Organizações sempre vislumbraram a democracia como processo fatal à sua supremacia. E essa era uma avaliação correta. Deter o movimento profundo que vinha das urnas seria impossível.

A centralidade de Lula e do Partido dos Trabalhadores no cenário político era o avanço do cidadão negado, desde sempre, em sua cidadania. A construção da nova história objetivaria também o significado das eleições seguintes. Até a vitória em 2002, o acúmulo de forças trouxe à cena as esperanças políticas das classes excluídas. O rosto sofrido, que se contrapunha tanto à estética das modernizações conservadoras quanto à ética do neoliberalismo rentista, já não temia as bravatas e espertezas do adversário.

O rancor da mídia corporativa tem que ser contemplado como pano de fundo de uma grande derrota. Suas ameaças só não são trágicas porque, ao arreganhar os dentes, a grande imprensa introduz notas burlescas no discurso que se pretendia ameaçador. O diagnóstico que denuncia o fim da festa sai, ainda que codificado, dos débeis sustentáculos da credibilidade que lhe sobrou junto a setores protofascistas da classe média.

Ao criminalizar movimentos sociais, criticar a política externa tentando estabelecer paralelos entre Caracas e Tegucigalpa, e censurar premiações internacionais recebidas pelo presidente, o jornalismo produzido vai desenovelando a história da imprensa brasileira com impecável técnica televisiva.

Resta-lhe o apoio de uma direita sem projeto, voraz, cínica e debochada. Esse é o único troféu que ostenta em 2010, após ter sofrido o baque inaugural há 21 anos. Na década de 1980, ainda valia editar debates e fazer uso político de seqüestro de empresários. Afinal, não seria por apoio governamental que conferências debateriam monopólio e manipulação midiática.

Em outubro, a Globo não estará apostando apenas na candidatura de José Serra. Buscará, mediante retrocessos de toda ordem, garantir a sobrevida de uma ordem informativa excludente, incompatível com as regras mais elementares do Estado Democrático de Direito.


Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Miguel Torga



Gosto deste autor. Lúcido. Consciente da condição humana. Um crítico da política e educação portuguesas.Sobre a descolonização escreveria:
"fomos descobrir o mundo em caravelas e regressámos dele em traineiras. A fanfarronice de uns, a incapacidade de outros e a irresponsabilidade de todos deu este resultado: o fim sem a grandeza de uma grande aventura. Metade de Portugal a ser o remorso da outra metade".

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010







Mais um texto da Sônia. O amor é tema recorrente nos versos desta poeta.O site da Sônia é miscelâneo. Há artigos, crônicas, contos e outras "cositas mas". Em verdade, é uma revelação das várias facetas desta escritora.
Neste poema, temos a falência não do amor, mas de uma alma rota que, apesar da bancarrota, ainda deixa o coração a pulsar sem medo na busca de vencer a crise econômica-emocional-física .

BANCARROTA (SÔNIA MOURA, in www.idéiaseversos.com.br)



Gota de lágrima

De uma alma rota

Põe quem ama

Na rota

Da bancarrota



Amarga

A boca

Embrulha

O estômago

Enrijece

O corpo

Entorpece

A mente



Para tudo!



Somente

O coração,

Insistente,

Bate

Descompassadamente



E, sem medo

De isquemia ou de embolia,

Descontrolado

Em disritmias

O perdido coração

Segue em frente

Em busca de salvação

Em busca de milagre

Em busca de magia

Em busca da devolução

De um outro coração

Que saiu

Da sua rota

Deixando

Quem ama

A mendigar

O amor falido

Pobre ser perdido e

Na bancarrota

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Um homem,uma mãe, espelhos e o masculino.


Em postagem anterior, destaquei textos de três mulheres que tratam do universo feminino. Aqui destaco uma declaração de amor escrita por um homem. O poeta é Flávio Silva Corrêa de Mello. Flávio é meu filho. Não por ser meu filho, destaco o poema " Espelhos". Destaco porque é bom. Por força do ofício, tornei-me uma leitora bastante razoável. Por modéstia, não digo ótima. Escritora, não o sou. Nem pretendo.
Por força de ser mãe, sou uma leitora do Flávio desde...sempre. E desde sempre o achei bom escritor. Por modéstia, não digo ótimo.
Para minha culpa materna/ eterna e carregada sobre os ombros, nunca fui mãe ternura-coruja. Fui e sou mãe dever-generala. Mas sou mãe-amante. Amo meus filhos, não só por serem meus filhos, mas por serem homens do bem. Seres humanos que compreendem e sabem conjugar amor e dever.
Neste texto, o poeta deixa clara fragiligade/força do amor a dois. Amor e sexo são pasta de vidro. A rotina é na cama e na louça. A plenitude-luz é tentar iluminar o outro como "espelhos que se roçam". Amor sem pieguices. O erótico sem vulgaridades. É uma declaração de amor sem banalidades.
Digo, cheia de corujices, muito bom!

Espelhos
(de Flávio Corrêa de Mello, in Rio Movediço -blogspot)
para Flávia


Dois espelhos colados.
Frente e verso. Reversos.
no meio dos dois a cola,
a linha espremida
e sufocada. Ali, nós,
como lençol
grudento de suor,
somos pasta de vidro.

Ali no meio somos amor,
somos no nome
- a essência é o nome.

Se a cola é úmida ou seca,
Se o amor é na cama ou na louça,
somos o diário, o cotidiano
de dois espelhos que roçam,
gripam e espaldam
quando o sol desponta,
quando a rusga aponta.

Esse é o encontro
daquilo que nem
sabemos o quanto
e o como,
o quando e o que se é:
o nome, a força, a constância,
então refletimos, sim
refletimos, apenas isso,
refletimos cada um
seu modo de iluminar
o rosto do outro.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Três mulheres: Sônia... Líria...Marina.


Conheço Sônia Moura. Amiga das longas conversas, do trabalho, das lágrimas poucas e do riso farto. Acompanho os escritos de Sônia a partir da publicação de seu primeiro livro de contos Doze Mulheres.
Conheço Líria Porto. Nunca nos vimos em carne e osso. Conhecemo-nos por meio desta máquina e, mais tarde, por telefone. O início de nossa amizade deu-se no uso da 2ª pessoa. Por e-mail, ela enviou-me este “de família”. Acompanho os escritos de Líria desde 2001.
Conheço a escritura de Marina Colassanti. Sempre numa perspectiva subjetiva-analítica do universo feminino e social. E assim são seus contos, suas crônicas e seus poemas.
Essas mulheres são como o vinho. A cada dia, hora, minuto e segundo ficam melhores.
Seus escritos são vinho tinto que, numa taça de cristal, não se vê o fundo. Para saboreá-los, tem de se beber vagarosamente. Sentir o sabor e a espessura doces/amargas do viver. O sabor e o saber de ser mulher.
Transcrevo aqui três escritos destas mulheres que falam do existir, amar e sonhar.

1º escrito: existir

de família
líria porto(por e-mail- um presente da Líria)

mãe era serei_a
cheiro de flor e manhã

tinha manto verdejante
e nove filhotes no canto

pai era mar
ia e vinha

: supria a casa de sal
e peixes

eu
grão de areia
abismado
existia

*

“de família” é instigante nos recursos estilísticos da pontuação desta máquina chamada computador. O uso de "underline" e do asterisco estão perfeitos. Quanto à forma e conteúdo está aí estrutura da família tradicional. Metáforas perfeitas. O homem é pai-mar. A mulher é mãe - grão de areia abismado.

2º escrito: Amar
ETERNIDADE
( Sônia Moura) in www.soniamoura.com.br

Eternamente

Quero ser sua

Eternamante


Eternamente

Quero ser sua

Namorante

Constante

Inconstante

Vibrante


E, eternamente,

Quero deixar o tempo

Fazer de meu amor

A sua casa

Para que você

Se quede radiante

Ante

Os desejos mais brilhantes

Aqueles que só entendem

Os que são

Eternamente

Amantes (Do livro: Poemas em Trânsito )

Aqui Sônia brinca e brilha no uso do sufixo ante para falar do amor. Ser capaz de Amar é força vital no universo feminino. Mulher é éter, é amante. Inebria e radia quando ama. Toda mulher anseia amar e ser amada. Neste poema, é prioridade amar.



3º escrito:sonhar
Marina Colassanti (in Rotas em colisão, ed Rocco)

Sexta-feira à noite

Os homens acariciam o clitóris das esposas
Com dedos molhados de saliva.
O mesmo gesto com que todos os dias
Contam dinheiro, papéis, documentos
E folheiam nas revistas
A vida dos seus ídolos.

Sexta-feira à noite
Os homens penetram suas esposas
Com tédio e pênis.
O mesmo tédio com que todos os dias
Enfiam o carro na garagem
O dedo no nariz
E metem a mão no bolso
Para coçar o saco.

Sexta-feira à noite
Os homens ressonam de borco
Enquanto as mulheres no escuro
Encaram seu destino
E sonham com o príncipe encantado.


Neste sexta-feira, o tédio. O sexo sem fantasias. A rotina. Mas, lemos, principalmente, a capacidade feminina de sonhar.

3 poemas, 3 mulheres e a essência do feminino.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Lerna


Num dezembro qualquer, um aborrecimento muito sério levou-a ao fundo do poço da existência. Este aborrecimento causou pane no emocional e, consequentemente, no físico.

A partir daí, procurou entender o mito da hidra do Lerna.

A hidra tem 9 cabeças. Representam elas:
o desejo sexual intenso;
a prioridade do conforto material;
o dinheiro como fonte de felicidade;
as paixões desenfreadas;
o ódio aliado ao desejo de vingança;
o poder;
os vícios;
o orgulho quando é arrogância;
a crueldade.

Para vencer e encontrar a paz e a felicidade internas, a hidra deve cortar as nove cabeças e entregá-las ao pântano de Lerna que tudo suga.

Dedicou-se ao trabalho de repensar a os conceitos e (pré)conceitos existenciais para sair do fundo do poço. Analisou as 9 cabeças. Ficou doente emocional e fisicamente. Encarou-se de frente e começou a achar o caminho do Lerna para entregar ao pântano os aspectos nocivos dessa representação simbólica.

Quando nos entregamos às nove cabeças hídricas, corremos o risco de tornarmo-nos menos humanos e perdermos o prumo de uma vida plena. Tornamo-nos teimosos-arrogantes e instalamos, inconscientemente, a perda.
Perdemos o Prazer da beleza do sexo, do amor, do conforto, do trabalho.
Entregou todos os negativos ao pântano.
Desinstalou a perda e (re)viveu!

"Uma bem desenhada ficção"


A bipolaridade do ser humano é o traço mais encantador do fato de sermos apenas humanos. Leitora do Barroco, aprendi a luta constante entre nossos opostos. Um não existiria sem o outro. Sem o ódio, não saberíamos o que é o amor. Não por acaso o poema Cântico Negro,de José Régio, é, dentre muitos outros, um dos meus prediletos.
O verso " nasci do amor que há entre deus e o diabo" traduz, para mim, a nossa fragilidade existencial.
Transcrevo, aqui, o que o jornalista Wanderley Soares publicou em sua coluna, no jornal O Sul, por ocasião do Natal de 2009. Um outro viés que nos coloca frente à nossa dualidade.


" Iguais
Aqui da minha torre, como um humilde marquês, todos os dias, tento descobrir os segredos dos escaninhos de um universo árido e amargo. Andejo dos becos da sarjeta aos salões da Justiça e, sem raridade, vejo, nos dois extremos, figurantes com princípios iguais. Em cada nova cena deste espetáculo imprevisível somente é possível ver que o leão nasce e morre leão, como acontece com a cobra, que nunca deixa de ser cobra.

A criatura humana, no entanto, traz, dentro de si, os instintos do cordeiro e da víbora. Nesta moldura, durante as festas religiosas - e, para os cristãos, o Natal é a comemoração maior - a idéia é a de que todos nós somos cordeiros irmãos. Trata-se, este momento, de um delicioso desejo e uma bem desenhada ficção. Valendo-me, então, deste hiato na aridez e na amargura do universo em que, a cada dia, vasculho, tento controlar, em mim, o cordeiro e a víbora e, sendo uma criatura comum, deixo aqui o meu poema e a mensagem de um Feliz Natal a todos os meus iguais".

Fumar II





Ela teve uma infância segura. Uma família que lhe deu um norte. A mãe dizia-lhe sempre:”- marido de mulher é emprego”. Cresceu ouvindo este lema. Assim dedicou-se ao estudo, única forma, segundo a mãe, de crescer na vida, ter um bom emprego e não depender, financeiramente, de ninguém.
Viveu plenamente as décadas de 60 e 70. Admirava Simone de Beauvoir, Jean Paul Sarte e outros tantos de sua época.
Em 1962, prestou concurso vestibular para a faculdade de Direito do Estado. Tinha 18 anos e era uma universitária. Ainda estudante, trabalhou como secretária, telefonista internacional. Queria ter o seu próprio dinheiro para ir ao teatro, ao cinema, comprar os livros de que gostava. O pai dava-lhe casa confortável e comida farta. A mãe, o incentivo para o estudo e o trabalho. Os dois davam amor e segurança. Mais não podia querer.
O estudo e o trabalho não a impediram de namorar, ir à festas e, principalmente, ir ao cinema. Não perdia um filme francês da nouvelle vague. Fã ardorosa de Fellini.Nos filmes, as atrizes fumavam. Achou chique, passou a fumar. Gostou. Estimulava a concentração no estudo e no trabalho. O cigarro passou a ser um elemento de pausa para colocar o pensamento em ordem. Nos filmes, também, bebia-se. De bebida, não gostou. Tornou-se fumante, mas não bebante. Nunca teve interesse por outras drogas, apesar do cinema tê-las difundido. Mais tarde, a televisão aliou-se ao cinema nesta propagação das drogas lícitas e ilícitas.
Como diz o senso comum, nada acontece por acaso. Um colega de faculdade quebrou a perna. Ele era professor de inglês em uma escola particular e como sabia que ela era formada pelo curso Oxford e trabalhava usando o idioma, pediu que o substituísse por 10 ou 15 dias. Bendita substituição. Descobriu naquele momento a sua vocação. Sentiu-se feliz ao ministrar aulas.
Formou-se em Direito e em Letras. Dedicou-se à Literatura.
Gostava do que fazia. Sentia-se uma Educadora que usava a Literatura como um meio de formar seres humanos íntegros e antenados com o seu tempo. Com a Literatura, ensinou-os a amar e compreender a importância do saber ler e escrever para alcançar a estesia. Diziam-na ser muito inteligente. Ela mesma nunca soube o que era ser inteligente. Mas gostava de ouvir e chegou a acreditar.
Namorou. Casou e. descasou. Amou e foi amada. Foi desamada também. Educou os filhos que teve. Dançou. Riu. Chorou.
Ainda namora, ama, desama, dança, ri, chora, trabalha e estuda. Sobretudo, tem filhos íntegros e paga seus impostos.
Esta mulher tem algumas dependências químicas. A primeira é a do bom humor; a segunda é a necessidade de amar e aceitar o próximo; a terceira é o cigarro, ainda, lícito.
Mas, hoje, por ser fumante, esta mulher é um ser excluído de todos os locais sustentados pelos impostos que ela mesma paga.
Ela é fumante, não é doente na alma. Amar e não ser amado, mau humor, ressentimento, rancor matam mais que o cigarro. A bebida também.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Coisas do idioma









A propósito de uma conversa no bar, minha amiga, a escritora Sônia Moura, enviou-me um poema de Alice Ruiz:


"Apaixonada


Apaixotudo


Apaixoquase".

 Essas conversas de bar, sempre entre um chope e outro, geram papos de conteúdos brilhantes-filosóficos. Conversando sobre amores idos e vindos, surgiu a poeta Alice Ruiz, entre outros.
A criatividade dos escritores é sempre surpreendente e rica. Esclareço que não sou uma escritora no sentido restrito, sou na verdade, uma escrivinhadora e uma leitora razoável.
Na condição de leitora razoável, leio Alice que neste textículo brincou/brilhou com as categorias gramaticais. Nada  pode ser, conforme o contexto , um substantivo,um advérbio, um pronome indefinido; tudo um pronome indefinido; quase um advérbio.
Dizemos que estamos apaixonada/os, então apaixonamo-nos pelo nada. Está paixão está no sonho, naquilo que fantasiamos do outro. De fato, não é nada.
Apaixonar-se é pelo tudo. Pela rotina, pela mau humor, pelos arrotos, pela meia furada, pelo suor, pelas rabugices e incluir nisso tudo o sonho e a fantasia.
Valeu para pensar em paixões e que tais.
Lembrei-me agora de um poema de Álvaro de Campos/ Fernando Pessoa, que também usa  o idioma bincando com um sufixo. Diz o poema mais ou menos assim:
" O que há em mim é simplesmente cansaço/ nem disto nem daquilo nem sequer de tudo ou de nada/ (....)/um supremíssimo... íssimo...íssimo...íssimo cansaço".
Conclui que sou issimamente apaixoquase.
Valeu Sônia, valeu Alice e valeu Fernando.
 

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Ólimpíadas vs Olimpíada

Existem algumas expressões que usamos no dia-a-dia e não nos damos conta da pertinência(ou não) delas.Eu mesma digo olimpíadas. Mas li numa coluna publicada em 03/10/09, no jornal O Sul ,esta a nota:

"Olimpíada
A escolha do Rio para sediar os jogos olímpicos de 2016 talvez sirva, pelo menos, para que alguns coleguinhas entendam que o Brasil vai sediar uma olimpíada e, nunca, as olimpíadas".

O autor, o jornalista gaúcho Wanderley Soares, fez observação bastante pertinente. Sem a menor dúvida, o escrito do Wanderley tem lógica, principalmente, pq é dirigida "aos coleguinhas".Tomara que sirva aos profissionais da comunicação.


Em verdade vos digo,o uso do cachimbo faz a boca torta, será que me lembrarei, daqui pra frente, de falar e escrever olimpíada? A nota tem fundamento. O uso do cachimbo também, pelo menos para nós, os simples mortais.


Valeu o toque jornalista!



quarta-feira, 30 de setembro de 2009







O mar, o tempo e leituras


Algumas vezes ao lermos textos diversos nos deparamos com algumas expressões que nos remetem à reminiscências. Não uma saudosista por natureza. Não sei se isso é positivo ou não. Penso que é melhor viver o agora, porém, no agora somos o resultado da poeira do nosso tempo. Foi esta expressão, lida num texto qualquer, que me fez reminesciar. A partir daí, lembrei-me de algumas expressões que marcaram o meu agora.
A primeira delas, foi quando num período conturbado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro/FFP-SG, não lembro datas, numa daquelas assembléias típicas das greves, um aluno, que era da Marinha, pediu a palavra e ao microfone disse em alto e bom som: " a nau está sem timoneiro". Sem considerarmos a situação quando isso foi dito, o que li me recordou esse aluno, já um senhor de cabeça e bigode brancos, e essa constatação. De fato, em nossa nau-nave-vida , não sabemos quem é o timoneiro. Por vezes, pensamos que somos nós mesmos, mas com Camões repito: " ledo engano d'alma".
A segunda, foi a crônica Nós, águas e pedras, de Wanderley Soares. Nesta crônica o autor refere-se ao universo feminino e masculino. Se os homens não entendem o universo feminino, as mulheres, apesar de mães de homens, também não endentem o universo masculino. Eu, particularmente, não entendo nem o feminino, nem o masculino. Mas recordei-me de uma expressão daquela crônica: " ... marinheiros, viajores de todos os mares..." E nesta viagem, vamos vivendo este bipolar desentendimento. Amando, desamando, chorando e rindo.


A terceira e última, lembrei-me de uns versos dos poetas e músicos Hermínio Belo de Carvalho e Paulinho da Viola que assim dizem:" não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar".